O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Napoleão Maia,
mudou de posição para beneficiar temporariamente um prefeito do interior
do Maranhão, após ele ter contratado o filho de um ministro do tribunal
para atuar na causa.
No STJ, ele é relator de um processo que
discute a condenação por improbidade do prefeito de Bacabal, no interior
do Maranhão. José Vieira Lins é acusado de usar dinheiro público para
se promover.
Por duas vezes, Napoleão decidiu contra o prefeito. O
motivo é uma discussão de prazos. Em março de 2016, passou a vigorar o
novo Código de Processo Civil, que dava mais tempo para entrar com
recurso do que o código anterior. Para evitar confusões, os ministros do
plenário do STJ se reuniram naquele mês e definiram as regras para
transição.
Foi baseada nestas regras que uma Turma de cinco ministros do tribunal, por unanimidade, disse que o prefeito perdeu os prazos.
Houve
então o recurso, que caiu no gabinete do ministro Napoleão. Na primeira
primeira decisão, Napoleão disse que o prazo foi perdido. Para ele,
valia o Código de 1973, assim como a Turma havia decidido.
Essa decisão é de 20 de março de 2017. Três dias depois, Napoleão tomou um medida incomum. Sem
ser provocado, ele mudou por conta própria a decisão. A ideia era
reforçar que o recurso estava rejeitado porque o prefeito perdeu o prazo
e, assim, o caso estava encerrado. O termo técnico para isso é
“trânsito em julgado”.
Nessa
decisão, Napoleão foi duro ao ponto do dizer duas coisas: que o
processo estava encerrado há mais de um ano e que essa situação era
“incontornável”.
Mas não demorou muito e o ministro mudou de
ideia. No meio do caminho, o prefeito de Bacabal trocou de defesa e quem
assumiu a causa foi o advogado Otávio Noronha.
Otávio
é conhecido pelo sobrenome. Ele é filho de João Otávio de Noronha,
colega de Napoleão como ministro do STJ. Noronha, o pai, é também
corregedor nacional de Justiça, no Conselho Nacional de Justiça.
Como
advogado da causa, Otávio Noronha argumentou, entre outras coisas, que o
período de transição do código velho para o novo causou confusão.
O argumento do filho do ministro João Otávio de Noronha foi suficiente para convencer o colega Napoleão Maia.
Depois
da Turma de cinco ministros do STJ ter rejeitado o caso e o próprio
Napoleão ter duas vezes negado os recursos, o ministro se sensibilizou
pela confusão citada pelo advogado e decidiu rever o caso.
Napoleão
citou a decisão do Plenário do STJ, que estabeleceu as regras para os
prazos, mas disse que não estava claro como aplicá-las e por isso era
preciso, de novo, analisar o caso.
O ministro não só reabriu o
processo como, numa canetada, decidiu suspender a condenação do tal
prefeito, em decisão de junho deste ano.
O
processo ainda será julgado pela 1a Seção do STJ e, até lá, os efeitos
da condenação estão suspensos. O parecer do Ministério Público Federal é
de que o STJ já definiu as regras e, no caso do prefeito, ele perdeu o
prazo.
“Não há dúvida a ser sanada, porquanto a decisão
originariamente atacada foi proferida em momento anterior à vigência do
novo código. Este o critério estabelecido nos enunciados nº 2 e 3 do
STJ, e não o critério pretendido pelo agravante/recorrente, que defende a
tese de que a referência temporal deveria ser o término do prazo
previsto na legislação anterior”, diz o MPF.
Procurado, o advogado
Otávio Noronha disse que a questão é controversa e por isso o tribunal
analisará o caso. “O recurso foi na transição dos Códigos e é uma
matéria nova que deverá ser enfrentada pelo tribunal. É um assunto
relevante”, disse.
Ele afirmou, ainda, que sua atuação é
transparente e não há relação com a atuação do pai. “Me causa estranheza
levantar uma hipótese dessa. Tenho procuração nos autos, trabalhando de
forma correta. Peticionamos em nosso nome, não há qualquer tipo de
dúvida em relação à lisura de nossa atuação”.
A assessoria do
ministro Napoleão disse que a 1a Seção do STJ deverá levar o caso a
julgamento no dia 13 de setembro. De acordo com a chefe de gabinete do
ministro, Mariana Costa, cabia discussão sobre os prazos e, por isso, o
ministro decidiu suspender o recurso até a decisão da Seção.
“Isso
porque, o recurso foi interposto no primeiro dia da vigência do novo
CPC, que tem prazo recursal mais alargado; assim, restou discutível qual
o prazo aplicável ao referido processo. Ademais, o novo CPC trouxe ao
ordenamento jurídico um recurso inédito, chamado de INCIDENTE DE
ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA, o que se aplicaria perfeitamente ao caso
concreto. Desse modo, achou-se melhor suspender o recurso e levar para o
colegiado decidir, o que será feito no próximo dia 13 deste mês”, disse
a chefe de gabinete.
De acordo com a assessoria do ministro,
Napoleão aplica esse entendimento em casos similares e não há relação
entre a decisão e o advogado. “Registro, ainda, que caso haja interesse,
poderia constatar a posição do Ministro Napoleão sobre essas questões
procedimentais para conhecer recursos, ele tem inúmeros votos afirmando a
necessidade de se julgá-los pelo seu mérito, no que segue, aliás, a
ideologia dominante do CPC/15. Portanto, a posição judicante do Ministro
segue a sua percepção doutrinária, sem qualquer relação com as partes
ou seus advogados”.
Fonte: Gilberto.Leda.
Adaptação; V.O.
Adaptação; V.O.
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