SENTENÇA
RELATÓRIO
Trata-se de prestação de contas de campanha relativas às eleições municipais de 2024 apresentadas por JOSÉ ROBERTO COSTA SANTOS, candidato ao cargo de prefeito do município de Bacabal/MA.
Publicado o edital e intimado o Ministério Público Eleitoral, não houve impugnação.
A unidade técnica emitiu relatório preliminar e pugnou pela expedição de diligências para saneamento das falhas/irregularidades detectadas, na forma do artigo 69, §1º, da Res. TSE 23.607/2019 e artigo 30, § 4º da Lei nº 9.504/1997 (ID 124581260).
Em atendimento, o prestador apresentou a petição de ID 124631937, com explicações, justificativas e documentos anexos, além de apresentação de contas retificadoras, com extratos.
Em parecer conclusivo, a unidade técnica entendeu que os esclarecimentos do prestador sanaram as impropriedades apontadas e opinou pela aprovação das contas com ressalvas (ID 124652466).
Instado a se manifestar, o Ministério Público Eleitoral solicitou novos esclarecimentos ao prestador, especialmente sobre os valores gastos com combustíveis, ausência de registro de despesas com jingles e propaganda sonoras, valores gastos com serviços advocatícios e contábeis, disparidade entre contratações e doações declaradas e a estrutura mostrada em suas redes sociais, detalhando os custos de produção e distribuição de diversos modelos de camisas padronizadas, adesivos e outros materiais de campanha. (ID 124689881). Em resposta, sobreveio a petição de ID 124713514.
Por fim, o Ministério Público Eleitoral entendeu como insuficientes os esclarecimentos e opinou pela desaprovação das contas (ID 124734692).
Vieram os autos conclusos.
É o relatório. Decido.
FUNDAMENTAÇÃO
- DAS QUESTÕES PRELIMINARES
Na petição de ID 124713514, o prestador suscitou questões preliminares, as quais passo a analisar.
i.1) Da (im)possibilidade de dilação probatória
Inicialmente, o prestador sustentou que “a prestação de contas eleitoral não admite dilação probatória”. E é cediço que tal tese não prospera.
O próprio rito da prestação de contas de campanha eleitoral, disposto na Resolução TSE nº 23.607/2019, estabelece ampla dilação probatória, uma vez que o prestador pode ser intimado a dar esclarecimentos, apresentar prestação de contas retificadora, comprovantes de despesas realizadas e quaisquer outros documentos que interessem à busca da verdade real.
A própria Justiça Eleitoral pode obter extratos bancários e documentos fiscais através do sistema SPCE, que tem interface com o Banco Central e com a Receita Federal.
Isso tudo nada mais é do que uma clara evidência de que a prestação de contas é um processo judicial onde é plenamente admitida, caso necessária, a dilação probatória. Junte-se a isso, o fato de não haver nenhum dispositivo no ordenamento jurídico proibindo a dilação probatória no processo de prestação de contas eleitorais.
i.2) Da (im)prestabilidade dos documentos juntados pelo Ministério Público Eleitoral
Noutro giro, o prestador alega que os documentos juntados aos autos pelo Ministério Público Eleitoral são inservíveis. Assim, impugnou a autenticidade dos mesmos.
Não assiste melhor sorte a essa tese defensiva.
Os elementos apresentados pelo MPE são documentos produzidos pelo próprio prestador e sua coligação, comunicando a realização de eventos (IDs 124690095; 124690094); tabelas de referência para cobrança de honorários advocatícios (ID 124690080) e de serviços de contabilidade (ID 124690079), de entidades de classe de conhecimento público, além de imagens capturadas das redes sociais do prestador, com utilização da plataforma MEDI.
A plataforma MEDI é uma solução digital desenvolvida pelo Ministério Público de Goiás para coleta de provas online, alternativa à ata notarial e tem reconhecida validade no âmbito jurídico.
Assim sendo, os documentos apresentados pelo Ministério Público Eleitoral são autênticos, não havendo qualquer indício de falsidade e/ou necessidade de realização de perícia ou diligência de qualquer natureza.
Pelo exposto, rejeito as preliminares suscitadas.
- DO MÉRITO
Do detido exame dos autos, verifica-se que o interessado não cumpriu integralmente as disposições da Lei das Eleições e da Resolução TSE nº 23.607/2019, que disciplinam a prestação de contas eleitorais no Brasil.
Dito isto, passo à análise das irregularidades constatadas pela unidade técnica durante a análise da presente prestação de contas e pelo Ministério Público Eleitoral, na qualidade de fiscal da lei.
ii.1) Descumprimento do prazo para envio dos dados relativos aos recursos financeiros recebidos na campanha, estabelecido pela legislação eleitoral, em relação às doações listadas (art. 47, I, da Resolução TSE nº 23.607/2019)
Foi constatado o descumprimento do prazo de 72 (setenta e duas) horas para o envio de dados relativos a recursos financeiros recebidos. O prestador disse que, embora fora do prazo, essas informações foram apresentadas e constam da prestação de contas final, garantindo a transparência e a verificabilidade das contas e não prejudicando a confiabilidade dos documentos contábeis. Tratando-se apenas de falha formal, que não obstaculiza a efetiva fiscalização da movimentação financeira realizada durante a campanha (ID 124631937).
ii.2) Detecção de gastos eleitorais realizados em data anterior à data inicial de entrega da prestação de contas parcial, mas não informados à época (art. 47, § 6°, da Resolução TSE n. 23.607/2019)
O candidato esclareceu que os documentos comprobatórios foram posteriormente anexados, cuidando-se também, apenas de falha formal, que não obstaculiza a efetiva fiscalização da movimentação financeira realizada durante a campanha. Pede sejam aplicados os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (ID 124631937).
ii.3) Realização de despesas junto a fornecedores, que possuem número reduzido de empregados, o que pode indicar ausência de capacidade operacional para prestar o serviço ou fornecer o material contratado
Em resposta à diligência, por meio da petição ID 124631937, o candidato informou que conforme dados de CPNJ e QSA disponíveis no site da Receita Federal do Brasil (em anexo), a empresa CS CONSULT é uma sociedade limitada composta por dois sócios, o que demonstra sua capacidade operacional, pois estes podem, por desforço próprio e conjunto, realizar os objetivos sociais. Ademais, não cabe ao Prestador, como qualquer consumidor de produtos e serviços, verificar previamente a quantidade de funcionários dos fornecedores que contrata.
ii.4) O valor dos recursos próprios supera em R$ 777,16 [soma RP menos 10% do limite de gastos fixado para a candidatura] o limite previsto no art. 27, §1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019
Foi ultrapassado o limite de recursos próprios aplicados na campanha. Em resposta à diligência, o candidato informou o valor excedente corresponde a irrisórios 0,18% (dezoito centésimos por cento) em relação ao limite de gastos. Além disso, diz se tratar apenas dos recursos próprios do Prestador e que não foi ultrapassado o teto de despesas, considerado em seu montante total. Que também não existe provas robustas de má-fé, cuidando-se apenas de falha formal, que não obstaculiza a efetiva fiscalização da movimentação financeira realizada durante a campanha (ID 124631937). Pugnou pela aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
ii.5) Inexistência de registro de despesas relacionadas a atividades de militância e mobilização de rua, bem como de doações estimáveis em serviços envolvendo pessoas para distribuição de santinhos e adesivos, bem como gastos com combustível e veículos
Alega o Ministério Público Eleitoral que as despesas declaradas com militância e mobilização de rua são incompatíveis com a estrutura e organização demonstradas nas redes sociais do candidato, sendo os números apontados visivelmente destoantes (ID 124689881).
Em resposta, o prestador afirmou que que todos os gastos que realizou foram declarados em sua prestação de contas. Que a participação em massa dos eleitores foi espontânea, que não houve cadastramento ou controle prévio, razão pela qual não há como fazer registro no balanço contábil. (ID 124713514)
Também alegou que não houve qualquer contraprestação aos apoiadores, e que não custeou combustível para todos os eleitores que aderiram às suas carreatas, pois os eleitores e simpatizantes compareceram aos movimentos coletivos em seus próprios veículos (ID 124713514).
ii.6) Indícios de omissão ou subdeclaração de despesas com serviços advocatícios e contábeis
Consignou o Parquet Eleitoral (ID 124734692), verbis:
“No que tange às despesas com serviços de contabilidade e advocacia, o valor declarado de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para cada serviço está significativamente abaixo do que é estipulado nas tabelas de honorários da OAB-MA e da Associação Nacional de Profissionais de Contabilidade, sobretudo por ser referente ao período entre os meses de agosto até os dias de hoje, com diversas representações, defesas, recursos e outros documentos, além da fiscalização no dia da eleição, que demandou a presença de inúmeros advogados espalhados por todos os locais de votação. Essa discrepância gera sérias suspeitas quanto à regularidade das informações prestadas, apontando possíveis irregularidades no registro de valores. A ausência de justificativas plausíveis para essa discrepância, quando comparado aos valores da tabela padrão, sugere uma tentativa de mascarar gastos reais da campanha, comprometendo a análise das contas e prejudicando a confiabilidade do que foi declarado. ”
Sobre o tema, o prestador alega que os gastos com esses profissionais foram devidamente comprovados e os valores livremente pactuados entre contratante e contratados, não cabendo ao MPE nenhuma ingerência sobre o assunto, em homenagem ao direito fundamental à liberdade de exercício de trabalho, ofício ou profissão (CF, art. 5º, XIII). Que as tabelas de honorários das entidades de classe de advogados e contadores são apenas sugestivas, não obrigando os profissionais dessas áreas. (ID 124713514).
Considerando a presente prestação de contas de forma global, não vislumbro motivos suficientes para sua desaprovação. De forma geral, todas as receitas e despesas obrigatórias foram apresentadas, mesmo que algumas, fora dos prazos estipulados.
Não há ausência de informações e documentos comprobatórios da realização de despesas essenciais, omissões graves ou registros inadequados de movimentações financeiras que comprometam a análise e a confiabilidade das contas apresentadas pelo prestador.
Não há indícios de uso inadequado de recursos públicos (fundo partidário ou FEFC). Também não foi identificado pela área técnica recursos oriundos de fontes vedadas que justifiquem a reprovação.
Segundo a legislação eleitoral:
Art. 30. A Justiça Eleitoral verificará a regularidade das contas de campanha, decidindo: (Redação dada pela Lei nº 12.034, de 2009)
I - pela aprovação, quando estiverem regulares; (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
II - pela aprovação com ressalvas, quando verificadas falhas que não lhes comprometam a regularidade; (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
III - pela desaprovação, quando verificadas falhas que lhes comprometam a regularidade; (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
IV - pela não prestação, quando não apresentadas as contas após a notificação emitida pela Justiça Eleitoral, na qual constará a obrigação expressa de prestar as suas contas, no prazo de setenta e duas horas. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
§ 2º Erros formais e materiais corrigidos não autorizam a rejeição das contas e a cominação de sanção a candidato ou partido.
§ 2o-A. Erros formais ou materiais irrelevantes no conjunto da prestação de contas, que não comprometam o seu resultado, não acarretarão a rejeição das contas. (Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009)
Desse modo, considero que as falhas identificadas não comprometeram a regularidade da prestação de contas.
Destaco, que preocupação do Ministério Público Eleitoral com uma possível incompatibilidade dos números declarados - que seriam “visivelmente destoantes” dos movimentos e da estrutura mostrada nas redes sociais do candidato – embora legítima, não constitui razão jurídica suficiente para a reprovação das contas. As imagens e documentos juntados não fazem prova contundente da irregularidade da prestação de contas ou da ocultação de arrecadação e gastos indevidos.
Observo que, “a só aprovação das contas, com ou sem ressalvas, não afasta a discussão acerca da ocorrência de ilícitos como o abuso de poder, mormente se novos elementos probatórios forem descortinados, bem como o eventual ajuizamento de ação eleitoral com essa finalidade”. (GOMES, 2023, p. 387)
No tocante à aprovação com ressalvas, embora essa solução intermediária somente tenha sido introduzida no sistema eleitoral pela Lei n° 12.034/2009, há muito era admitida pela jurisprudência (vide TSE - Res. n° 22.499/2006; TSE - RMS n° 551/PA - D] 24-6-2008, p. 8) com fundamento nas ideias de razoabilidade e proporcionalidade. Estas orientam no sentido de que, consideradas as circunstâncias concretas, toda sanção deve ser proporcional à gravidade da conduta inquinada e à lesão perpetrada ao bem jurídico protegido.
“Deve-se optar pela enfocada solução quando forem evidenciadas faltas materiais que não tenham aptidão para comprometer a análise contábil das contas e, pois, a fiscalização exercida pela Justiça Eleitoral. ” (GOMES, 2023, p. 385)
Considerando que as irregularidades detectadas foram devidamente sanadas e/ou justificadas e os esclarecimentos apresentados pela defesa são suficientes para afastar os vícios apontados, não restando prejudicada a análise e a fiscalização das contas pela Justiça Eleitoral, entendo viável aplicar no presente caso os princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, considerando que as falhas remanescentes não comprometem a regularidade, a transparência e a confiabilidade do balanço contábil em análise, JULGO APROVADAS COM RESSALVAS as contas de campanha apresentadas pelo candidato JOSÉ ROBERTO COSTA SANTOS, nos termos do artigo 30, II, da Lei n. º 9.504/1997, combinado com o artigo 74, II da Resolução TSE n. º 23.607/2019.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Ciência ao Ministério Público Eleitoral.
Serve a presente sentença como mandado/ofício e demais expedientes necessários.
Todos os atos processuais serão cumpridos de ordem.
Após o trânsito em julgado, façam-se as devidas anotações nos sistemas SICO e ELO.
Ao final, arquivem-se.
Bacabal/MA, datado e assinado eletronicamente.
THADEU DE MELO ALVES
Juiz Eleitoral da 13ª Zona Eleitoral do Estado do Maranhão
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