O TCU (Tribunal de Contas da União) identificou indícios de
irregularidade em benefícios pagos pelo governo que somaram R$2,25
bilhões em 2018. A maior parte das suspeitas foi encontrada em
benefícios previdenciários acima do teto do INSS, acumulados
indevidamente ou concedidos mediante uso irregular de documentos num
total de R$ 957,1 milhões. Outros R$ 649,5 milhões em repasses duvidosos
são do BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago a idosos e pessoas
com deficiência de baixa renda.
Os dados serão encaminhados ao Poder Executivo e devem servir de base
para o governo direcionar os trabalhos da força-tarefa que faz a revisão
dos benefícios com indícios de irregularidade. O pente-fino foi
instituído pela MP (Medida Provisória) 871, transformada em lei pelo
Congresso Nacional.
A auditoria analisou 55,6 milhões de benefícios pagos em 2018,
incluindo Previdência, assistência, Bolsa Família, seguro-desemprego e
seguro-defeso (benefício de um salário mínimo pago a pescadores
artesanais durante o período de proibição da atividade de pesca).
Na análise dos dados da Previdência, o TCU detectou no ano passado 34
mil casos de acumulação indevida de benefícios, além de 25,2 mil casos
de uso irregular do CPF ou do NIT (Número de Inscrição do Trabalhador).
Há ainda 1.457 pessoas que receberam valores acima do teto do INSS (na
época, de R$5.645,80) indevidamente.
No caso do Bolsa Família, havia 207,7 mil beneficiários com renda
formal acima do limite permitido no programa. O benefício é pago a
famílias com renda per capita de até R$178 (valores de 2018).
Mas havia beneficiários com renda per capita até acima de 10 salários
mínimos. Há ainda sócios de empresas com "alto capital social" e com
"alta folha de funcionários" que receberam o Bolsa Família,
provavelmente de forma irregular. Pessoas já falecidas também receberam
pagamentos do programa.
No BPC, foram identificados 12,8 mil beneficiários com indícios de
fontes de renda incompatíveis com as regras do programa, incluindo
servidores federais e seus pensionistas.
Os auditores também encontraram outros R$12,8 bilhões em benefícios com
problemas de cadastro, de menor potencial. As inconsistências se dão
até por abreviação de nomes ou por conta de datas inválidas. Esses dados
serão encaminhados para os órgãos para a atualização cadastral junto
aos beneficiários.
Esse é o quarto ciclo de análises feito pelo TCU, que começou a auditar
os benefícios anualmente em 2015. Nos pagamentos de 2019 o objetivo dos
auditores é ampliar o alcance do trabalho, filtrando os indícios de
irregularidade por Estados e cruzando os dados com informações sobre
judicialização.
Parte considerável dos benefícios previdenciários e assistenciais é
paga por determinação da Justiça. Em 2018, foram R$ 92 bilhões em
repasses a segurados do INSS e beneficiários do BPC por decisão
judicial. O valor responde por 15,1% do total de benefícios.
Ao avaliar os dados de 2018, a auditoria já detectou alguns benefícios
concedidos pela Justiça entre os que têm indício de irregularidade, mas
esse cruzamento de dados ainda não é feito de forma ampla. Com mais
essas informações, será possível identificar se os valores concedidos
pela Justiça respondem ou não pela maior parte das irregularidades.
O governo já entrou em alerta por conta do alto índice de ações na
Justiça envolvendo benefícios previdenciários e assistenciais que traz
um custo operacional de cerca de R$ 4,6 bilhões para os cofres públicos,
entre gastos com a defesa e com perícias judiciais.
A equipe econômica tentou, na reforma da Previdência aprovada na Câmara
dos Deputados, estabelecer um critério mais claro sobre a condição de
miserabilidade que dá direito ao BPC, um dos pontos que são
judicializados. A ideia era fixar na Constituição que o benefício só
pode ser concedido a idosos e pessoas com deficiência com renda familiar
per capita de até 25% do salário mínimo.
O relatório do projeto que será votado no Senado Federal no entanto,
retirou isso do texto. Com isso, seguirão prevalecendo os diferentes
entendimentos dos tribunais - ou seja pessoas de famílias com renda per
capita superior ao que o governo queria fixar devem continuar tendo
direito ao pagamento.
Alcance limitado
Os indícios de irregularidades encontrados pelo TCU ficam entre 0,5% e
1% dos benefícios, um porcentual menor que o encontrado em nações
desenvolvidas, como os Estados Unidos, onde esse índice chega a 4%. O
resultado menor, porém, não deve ser visto como mérito brasileiro, pelo
contrário. A avaliação de auditores é que o País ainda não conseguiu
criar mecanismos para detectar todas as fraudes.
No ano passado, o Tribunal contratou uma empresa que estimou que de 11%
a 30% dos benefícios pagos pelo INSS podem ter algum tipo de erro ou
fraude.
Apesar disso, os auditores alertam que a detecção das fraudes não
resolve por si só o déficit da Previdência, que vai chegar a R$ 244,2
bilhões no ano que vem, de acordo com as previsões do governo.
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