O Brasil é um dos países que mais bebem cerveja no mundo, com um
consumo de cerca de 70 litros por ano por pessoa. O que é certo é que no
verão se toma mais, porque para muita gente a estação mais quente do
ano "pede" uma gelada. Mas é preciso ter cuidado. Alguns especialistas
alertam que esta bebida, principalmente em excesso, pode aumentar a
chance de infecção pelos vírus da dengue, zika, chikungunya e malária.
O
professor titular do Departamento de Microbiologia, Imunologia e
Parasitologia (MIP) do Centro de Ciências Biológicas (CCB) da
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Carlos Brisola Marcondes,
cita dois estudos, um realizado no Japão e outro em Burquina Faso, que
verificaram que a ingestão de cerveja atrai mais mosquitos para o
bebedor.
Ou seja, a bebida aumenta o número de picadas dos
insetos hematófagos transmissores de doenças em quem a consome, e,
consequentemente o risco da doença.
Na pesquisa japonesa, foi testada uma dose de 350 ml de cerveja feita de cevada, para a atração do Aedes albopictus, parente próximo do Aedes aegypti.
Em Burquina Faso, os pesquisadores deram aos participantes uma
quantidade não informada de uma feita com sorgo (4% de álcool),
localmente chamada de dolo, para verificar o resultado sobre a espécie Anopheles gambiae, transmissor da malária.
"Em
ambos os estudos, se notou um aumento significativo na atração dos
insetos", conta Marcondes. "Além disso, no segundo trabalho,
verificou-se também o estímulo ao voo dos mosquitos. Este efeito foi
atribuído à dispersão do álcool pelo organismo com presença de etanol no
suor."
De acordo com ele, no estudo feito no Japão houve
variações na temperatura corporal do bebedor, dependentes da sua
tolerância ao álcool.
"Em Burquina Faso, no entanto, se observou
que a redução de temperatura corporal e a quantidade de gás carbônico
(CO2) exalado (esta última não influenciada pela cerveja) não tiveram
efeito significativo sobre a atração", informa Marcondes.
"Os
autores supuseram que com a cerveja haveria maior produção de
cairomônios (as substâncias voláteis emanadas dos bebedores), que
atrairia mais mosquitos."
Esses cairomônios e o álcool não são as únicas substâncias que
aumentam o número de picadas. "Há várias que atraem mosquitos, sendo as
mais conhecidas o gás carbônico e o ácido láctico (liberado no suor), e
certamente há outras que ocorrem naturalmente no corpo que os repelem.",
diz Marcondes.
"Para algumas espécies, crianças são mais
atraentes que adultos e negros mais que brancos, mas para outras é o
contrário. Isto é um campo de grande importância a ser explorado por
mais pesquisas científicas."
O médico sanitarista Rodolpho,
Telarolli Júnior, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas do campus de
Araraquara, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), enumera outros
exemplos.
"Alguns estudos demonstram (mas isso não é unânime) que
os mosquitos são atraídos por indivíduos cuja respiração contenha
maiores teores de gás carbônico, como é o caso daqueles que acabaram de
fazer exercícios físicos e estão com o metabolismo mais acelerado",
explica. "O mesmo valeria para as gestantes, que apresentam condição
semelhante durante toda a gravidez, bem como os indivíduos com sobrepeso
ou obesidade."
De acordo ele, os insetos hematófagos teriam maior atração pelas
pessoas e pelas áreas do corpo humano com maior temperatura. "É o caso
dos indivíduos com febre, como os portadores de doenças transmissíveis,
como a dengue, por exemplo", diz Telarolli.
Segundo ele, por
motivos ainda ignorados, alguns estudos demonstram que há espécies que
têm preferência em picar indivíduos com tipo O de sangue, em detrimento
daqueles com outros tipos (A, B e AB). "Outras pesquisas têm demonstrado
que o uso de roupas escuras é um fator que pode atrair mais os
mosquitos", revela Telarolli.
"Então, em áreas de grande
infestação por esses insetos, é prudente usar roupas de cor clara e os
portadores de sangue tipo O devem redobrar os cuidados."
O que se
pode concluir, segundo Marcondes, é que a pele e o ar expirado exalam
substâncias que influenciam a preferência de mosquitos, diferenciando os
indivíduos e levando os insetos a ter preferência por crianças,
diferente da que têm por adultos.
"Há também variações entre
raças", diz. "Mas a ecologia química da atração deles é um assunto
difícil e ainda pouco compreendido. A hematofagia (ingestão de sangue)
desses animais depende de fatores complexos, envolvendo olfato e visão,
esta última principalmente em espécies diurnas, como a mosca tsé-tsé, da
doença do sono, e o nosso bem conhecido Aedes aegypti."
Como se proteger de picadas de mosquito
Para
ele, deveriam ser feitos estudos com outras bebidas, além da cerveja,
para verificar se é o álcool que afeta os mosquitos ou algo
característico dela. "Seria também muito importante desenvolver testes
no Brasil, com insetos de vários grupos, como borrachudos, flebotomíneos
(moscas transmissoras de leishmaniose), maruins, e bebidas
nacionalmente bastante consumidas, como a cachaça", defende.
"Com poucos trabalhos sobre o assunto, é uma área aberta para pesquisas, que tem grande importância sanitária."
Outro
fator não estudado para aumentar a quantidade de picadas é a provável
redução da capacidade de defesa contra as picadas das pessoas que
beberam em excesso. "Pele de bêbado não tem dono", brinca Marcondes.
"Portanto, cuidado com a bebida, especialmente em grande quantidade,
pois pode aumentar a chance de ser infectado com malária, dengue e
outras doenças transmitidas por mosquitos."
Daí a importância de novos estudos. Ainda mais quando se sabe que um
dos principais determinantes da transmissão de doenças originadas de
insetos vetores é a frequência de picadas. "Desta forma, os fatores que
influenciam a quantidade delas são de importância epidemiológica", diz
Marcondes.
"Assim, por exemplo, o controle de malária é mais
eficiente se tiver como alvo principalmente os indivíduos que têm a
preferências dos mosquitos. As gestantes estão entre essas pessoas que
mais os atraem,"
Enquanto novas pesquisas não são realizadas,
algumas medidas simples ajudam a se proteger das picadas dos insetos.
"Evitar frequentar lugares onde os mosquitos circulam, como regiões
próximas a cursos d'água ou jardins ou outras áreas infestadas pelos
insetos é uma delas", diz Telarolli.
"Não usar roupas escuras
quando for necessário ir até esses locais; utilizar repelentes, que
devem ser aplicados sobre as roupas e não diretamente sobre a pele;
manter a casa com telas, quando viver em áreas infestadas; e quando
tiver ingerido bebidas alcoólicas ou no caso das gestantes redobrar os
cuidados com os mosquitos são outras medidas que devem ser tomadas."
MSN

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