quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

LAGO DO JUNCO/MA 2024: Prefeita, Edina Fontes é denunciada (RÉ) pelas péssimas escolas do município.

Prefeita, Edina Fontes é denunciada (RÉ) pelas péssimas escolas do município.


DECISÃO



Tratam os autos de Ação Civil Pública na qual figura como polo passivo o Município de Lago do Junco.



Narrou o Ministério Público que foi instaurado, no âmbito da 2ª Promotoria de Justiça, o procedimento administrativo nº 2990-509/2022, a partir de denúncia anônima registrada no canal da ouvidoria do Ministério Público, no dia 14/12/2022, visando apurar irregularidades no ensino ofertado pelo Município Lago do Junco/MA, especificamente na Unidade Escolar Raimundo Marques Lima, localizada no Povoado Centrinho do Acrísio, Lago do Junco/Ma.

Em suma, apontou a inicial que a unidade escolar em referência padecia de inúmeros problemas estruturais, sobretudo no telhado, além de estar infestada de cupins e morcegos, pondo em risco a integridade, a segurança e a saúde das crianças.

Ocorre que, como exposto pelo Representante do Ministério Público, após 10 (dez) meses de ofícios, análise de documentos, inspeções, recomendações e solicitações, o Município não conseguiu concluir uma simples reforma, realocando os alunos em locais precários, chegando a utilizar uma Igreja e uma casa de um dos pais de alunos para prestar um dos serviços mais importantes a uma criança em desenvolvimento, a educação de qualidade.



O requerente anexou aos autos (ID 101042363 e ID 101042364):  

 - Ofício nº OFC-2ªPJLAP - 162023, no dia 30/01/2023, ao Secretário Municipal de Educação de Lago do Junco/MA, solicitando a inspeção técnica do referido prédio, o envio de relatório e do plano de trabalho para a sua correção; 

resposta, por meio do Ofício 06/2023 - GAB/SEMED, o órgão municipal informou que no mês de janeiro foi realizada uma vistoria técnica nas escolas do Município, para avaliar suas estruturas físicas, dentre elas a Unidade Escolar Raimundo Marques Lima, que, conforme os critérios de prioridade, ocupou o 1º (primeiro) lugar na lista de reestruturação;

OFC-2ªPJLAP – 412023, no dia 21/03/2023, solicitando informações quanto à alocação dos alunos em outro prédio, se as aulas estavam se desenvolvendo regularmente e qual seria a previsão do início e da conclusão da referida obra;

Ofício 10/2023 - GAB/SEMED, a Secretaria asseverou que as crianças foram alocadas em um prédio da Igreja Católica da comunidade e na casa de alvenaria emprestada por um dos moradores;

inspeção na referida unidade escolar;

despacho com força de ofício, no dia 16/05/2023, ao Secretário Municipal de Educação, solicitando as seguintes informações, acompanhadas da documentação pertinente: a) cópia do contrato com a empresa responsável pela obra; b) cronograma da referida obra; c) lista com o nome e qualificação dos alunos matriculados na referida unidade escolar; d) nome do pároco responsável pela Igreja onde as aulas estão sendo ministradas;

- Ofício nº 20/2023 - GAB/SEMED, a Secretaria de Educação se limitou a informar que o atraso da obra decorreria das fortes chuvas, da dificuldade de acesso ao local e da escassez de mão de obra, solicitando compreensão do Ministério Público; apresentou cópia de contrato, termo de concordância dos pais dos alunos etc;

despacho/notificação ao órgão municipal (recebido em 02/06/2023), para que informasse, no prazo de 5 dias, o cronograma da obra e apresentasse as notas de empenho relativas à referida empresa no ano de 2023, bem como o contato da proprietária ou do empregado responsável pela obra;

-  Ofício nº 26/2023 - GAB/SEMED/PMLJ, o Município informou que as obras e a climatização iriam ser concluídas no prazo máximo de 30 (trinta) dias, juntando, para tanto, solicitação de nota fiscal pela empresa, relatório fotográfico e cronograma financeiro (pagamento), cujo total da obra de reforma da escola seria de R$142.470,00 (cento e quarenta e dois mil reais e quatrocentos reais), sendo executado 50% desse valor, no montante de R$71.235,00 (setenta e um mil duzentos e trinta e cinco reais);

A parte autora formula pedido de tutela de urgência.

É o relatório. Decido.


Para a concessão da tutela de urgência devem ser demonstrados os elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, de acordo com o disposto no artigo 300 do CPC.

Destaco que os requisitos estabelecidos no Art. 300 do CPC devem estar presentes de maneira concomitante para que haja deferimento da medida liminar em sede de tutela de urgência.

No presente caso, em análise preliminar própria desse momento de estreita cognição em sede de pedido de tutela, bem como a partir das alegações do Requerente e do rol documental carreado ao processo vislumbro estarem presentes, de forma concomitante, os requisitos para a concessão da tutela pretendida.

Nos termos do art. 6º "são direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição."

Ademais, o art. 24, CF, determina que "Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: IX - educação, cultura, ensino, desporto, ciência, tecnologia, pesquisa, desenvolvimento e inovação."

Evidente, portanto, a fundamentalidade do direito à educação, especialmente tratando-se de educação pública destinada às crianças e adolescentes, destinatários de proteção integral constitucional e na forma do que dispõe o art. 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Classificado como um Direito Social, a Educação reveste-se em um direito fundamental garantido por todos, Estado, família e sociedade.

Como tal, a educação também tem papel fundamental na busca por reduzir as desigualdades sociais, sendo assim, um vetor essencial no desenvolvimento subjetivo e social, estruturante da possibilidade de existência digna. Diante da sua importância, o direito fundamental à educação se encontra, ainda, expressamente previsto em diversos outros diplomas normativos universais, dentre os quais se destaca: Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de 1966, como observou o Requerente em sua peça.

É de conhecimento comum que a educação pública serve, primordialmente, à população mais necessitada, social e economicamente. Mães contam com o horário de permanência de seus filhos em escolas e creches para que possam trabalhar durante o dia.

Por sua vez, as crianças que frequentam as escolas e creches públicas contam com as refeições que ali fazem como parte da dieta cotidiana, de forma que, é importante frisar, o Estado se faz presente como agente fiador da segurança alimentar e laboral dessas crianças e seus pais e responsáveis. O atendimento dessas necessidades é, portanto, inadiável, podendo a greve comprometer gravemente esses direitos.

Em termos consequencialistas, portanto, o não funcionamento da escola gera resultados imensamente mais gravosos para os destinatários desses direitos, ainda que se tenha dado solução provisória.

Manter os alunos em instalações da paróquia ou casa cedida por morador local, em espécie de rodízio, não oferta o mesmo rendimento do ambiente escolar.

O efeito em cadeia da paralisação da educação, com crianças sem acesso às aulas e à merenda escolar, muitas vezes a mais importante refeição que a criança faz durante o dia, compromete de maneira extremamente grave a segurança alimentar desses indivíduos, sujeitos destinatários, reitero, de direito à proteção integral por parte do Estado, da família e da sociedade, com absoluta prioridade.

Além disso, as famílias mais carentes e necessitadas, que dependem da escola como local de realização de atividades de desenvolvimento das crianças e adolescentes, enquanto estão trabalhando, não têm onde manter seus filhos, resultando em danos não somente às famílias, mas à sociedade em geral.

O STF reafirmou a tese da fundamentalidade do direito à creche, realçando a importância da efetividade desse direito, debate trazido no Recurso Extraordinário (RE) 1008166, relacionado ao Tema 548 da repercussão geral, acórdão e fixação da Tese na forma seguinte:

 

Supremo Tribunal Federal RE 1008166 / SC EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. GARANTIA DE VAGA EM CRECHE OU PRÉ-ESCOLA ÀS CRIANÇAS DE ZERO A CINCO ANOS DE IDADE. AUTOAPLICABILIDADE DO ART. 208, IV, DA CF/88. PRINCÍPIOS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E DA RESERVA DO POSSÍVEL. VIOLAÇÃO. INOCORRÊNCIA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que assegura às crianças de zero a cinco anos de idade a primeira etapa do processo de educação básica mediante o atendimento em creche e o acesso à pré-escola (art. 208, IV, da Constituição Federal). 2. O Estado tem o dever constitucional de garantir o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão estatal e violação a direito subjetivo, sanável pela via judicial. Precedentes: ARE 639.337-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe de 15/9/2011; AI 592.075-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJe de 4/6/2009, e RE 384.201- AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, Primeira Turma, DJ de 3/8/2007. 3. O Poder Judiciário pode impor à Administração Pública a efetivação de matrícula de crianças de zero a cinco anos de idade em estabelecimento de educação infantil, sem haja violação ao princípio constitucional da separação dos poderes. 4. Ex positis, voto no sentido de, no caso concreto, NEGAR PROVIMENTO ao recurso extraordinário interposto pelo Município de Criciúma. 5. A tese da repercussão geral fica assim formulada: 1. A educação básica em todas as suas fases – educação infantil, ensino fundamental e ensino médio – constitui direito fundamental de todas as crianças e jovens, assegurado por normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade direta e imediata. 2. A educação infantil compreende creche (de zero a 3 anos) e a pré-escola (de 4 a 5 anos). Sua oferta pelo Poder Público pode ser exigida3 Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001. 3. O Poder Público tem o dever jurídico de dar efetividade integral às normas constitucionais sobre acesso à educação básica.



No presente caso, desde 30/01/2023, o Ministério Público notifica, oficia e despacha perante os órgãos municipais, buscando soluções extrajudiciais, no entanto, apesar da demonstração de iniciativa, quase 10 (dez) meses depois, não se foi possível a retomada das aulas.

Por essas razões, entendo, por ora, que restam preenchidos os requisitos autorizadores da concessão da tutela de urgência.



DAS ASTREINTES



Nos termos do art. 519 do CPC são aplicáveis à tutela de urgência as regras concernentes ao cumprimento de sentença.

O art. 536, §1º, do CPC prevê que:



Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.

§ 1º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.



As astreintes constituem mecanismo que visa conferir efetividade à decisão judicial e deve caminhar no sentido de incentivar o cumprimento da decisão. Assim, não devem ser excessivas, mas também não devem ser irrisórias, de modo a tornar vantajoso o eventual descumprimento da decisão.

Considerando a fundamentalidade da questão tratada nos autos, bem como a capacidade econômica do réu, entendo que a multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) cumpre o objetivo de conferir efetividade à decisão judicial.



DISPOSITIVO



À vista do exposto:

1) DEFIRO a tutela de urgência pleiteada pelo autor, para fins de fique compelido a dar início às aulas na Escola Raimundo Marques Lima, localizada no Povoado Centrinho do Acrísio, com alocação de mobília e todos os insumos necessários para a realização das aulas, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, a contar da intimação da decisão, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

02. Cite-se o(a) requerido(a) para, querendo, apresentar contestação, no prazo de 15 (quinze) dias.

03. Decorrido o prazo acima, intime(m)-se o(s) autor(es) para apresentar(em) réplica, no prazo de 15 (quinze) dias, nos termos dos arts. 350 e 3513, todos do Código de Processo Civil, mediante ato ordinatório a ser cumprido pela Secretaria Judicial, independentemente de nova conclusão dos autos.

04. Após a manifestação ministerial, nos termos do art. 357, caput, incisos II e IV, e §§ 2º, 3º do Código de Processo Civil1, e tendo em vista o Princípio da Cooperação (art. 6º CPC)2, intimem-se as partes para que, no prazo comum de 10 (dez) dias, delimitem as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, especificando os meios de prova admitidos que desejem utilizar (II) e as questões de direito que entendem relevantes para a decisão do mérito (IV).

4.1 Se as partes desejarem arrolar testemunhas, deverão fazê-lo no prazo acima, nos termos do § 4º do referido dispositivo e ainda deverão observar as diretrizes dos artigos 450 e 451 do Código de Processo Civil3.

4.2 Caso as partes não se manifestem, presumir-se-á o seu desejo de não produzir provas e o pedido inicial será julgado antecipadamente, nos termos do art. 355 do Código de Processo Civil.

4.3 No requerimento das provas, as partes deverão indicar a necessidade da prova e as questões de fato sobre as quais recairá a atividade probatória, sob pena de indeferimento do pedido, tudo nos termos do art. 369 e 370 do Código de Processo Civil.

4.4. Transcorrido o prazo ora fixado, com ou sem manifestação, voltem-me os autos conclusos.

05. Cumpra-se.



Lago da Pedra/MA, data da assinatura.



Marcelo Santana Farias

Juiz Titular da 1ª Vara da Comarca de Lago da Pedra/MA

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