SENTENÇA
Trata-se de prestação de contas de campanha relativas às eleições municipais 2024 apresentadas por Francisca Patrícia Pereira Teles, candidata ao cargo de vereador do município de Bacabal-MA.
Publicado o edital e intimado o Ministério Público Eleitoral, não houve impugnação.
A unidade técnica emitiu relatório preliminar e pugnou pela expedição de diligências para saneamento das falhas detectadas, na forma do artigo 69, §1º, da Res. TSE 23.607/2019.
Em atendimento, o prestador apresentou a petição de ID 124637165 e documentos anexos.
Em parecer conclusivo, a unidade técnica entendeu que os esclarecimentos do prestador sanaram as impropriedades apontadas e opinou pela aprovação.
Instado a se manifestar, o Ministério Público Eleitoral solicitou novos esclarecimentos à prestadora (ID 124686287). Em resposta, sobreveio a petição de ID 124713542.
Por fim, o Ministério Público Eleitoral entendeu como insuficientes os esclarecimentos e opinou pela desaprovação das contas (ID 124731800).
Vieram os autos conclusos.
É o relatório. Decido.
Das questões preliminares
Na petição de ID 124713542, a prestadora suscitou questões preliminares, as quais passo a analisar.
i.1) Da (im)possibilidade de dilação probatória
Inicialmente, a prestadora sustentou que “a prestação de contas eleitoral não admite dilação probatória”. E é cediço que tal tese não prospera.
O próprio rito da prestação de contas de campanha eleitoral, disposto na Resolução TSE nº 23.607/2019, estabelece ampla dilação probatória, uma vez que o prestador pode ser intimado a dar esclarecimentos, apresentar prestação de contas retificadora, comprovantes de despesas realizadas e quaisquer outros documentos que interessem à busca da verdade real.
A própria Justiça Eleitoral pode obter extratos bancários e documentos fiscais através do sistema SPCE, que tem interface com o Banco Central e com a Receita Federal.
Isso tudo nada mais é do que uma clara evidência de que a prestação de contas é um processo judicial onde é plenamente admitida, caso necessária, a dilação probatória.
i.2) da (im)prestabilidade dos documentos juntados pelo Ministério Público Eleitoral
Noutro giro, a prestadora alega que os documentos juntados aos autos pelo Ministério Público Eleitoral são inservíveis. Assim, impugnou a autenticidade dos mesmos.
Não assiste melhor sorte a essa tese defensiva.
Conforme sustentado pelo Parquet Eleitoral (ID 124686287), verbis:
“Tais circunstâncias restaram fartamente comprovadas a partir da análise das redes sociais do candidato, com diversas imagens e vídeos relacionados às ações promovidas por ele, conforme demonstra o Relatório de Captura Técnica de Conteúdo Digital, obtido mediante a plataforma MEDI, ferramenta reconhecida por sua elevada confiabilidade técnica e jurídica, que assegura a integridade das evidências coletadas, desenvolvida pelo Ministério Público de Goiás, reforçando a autenticidade dos documentos digitais anexados.”
O sistema MEDI (materializador de evidências digitais e informáticas) é um software desenvolvido pelo CyberGAECO do Ministério Público do Estado de Goiás justamente para realizar coleta automatizada de evidências digitais em investigações cíveis e criminais.
Além disso, os documentos anexados à manifestação do Ministério Público Eleitoral vieram acompanhados dos respectivos relatórios de coletas emitidos pelo sistema MEDI.
Assim sendo, os documentos apresentados pelo Ministério Público Eleitoral são autênticos, não havendo qualquer indício de falsidade e/ou necessidade de realização de perícia ou diligência de qualquer natureza.
Pelo exposto, rejeito as preliminares suscitadas.
Do mérito
Do detido exame dos autos, constata-se que a interessada não cumpriu as disposições da Lei das Eleições e da Resolução TSE nº 23.607/2019.
A seguir, passo à análise das irregularidades constatadas pelo Ministério Público Eleitoral, na qualidade de fiscal da lei (ID 124686677).
ii.1) da ausência de registro de despesas com cessão/locação de veículos, combustíveis, lubrificantes e militância
Inicialmente, o Ministério Público Eleitoral assevera que (ID 124686287):
“Ao analisar o extrato de prestação de contas apresentada pela candidata, observa-se que não foram declaradas quaisquer despesas relacionadas a combustíveis e lubrificantes, cessão ou locação de veículos, comícios, eventos de promoção de candidatura.
Contudo, ao contrário do que alega a candidata, restou comprovada a realização de inúmeros “arrastões”, eventos de rua com a participação ativa de militância na distribuição de santinhos e participação em carreatas, comícios e outros eventos relacionados à candidatura, com a utilização de carros e motos, que demandaram gastos excessivos com combustível, dentre outros.”
Em resposta, a prestadora afirmou que a participação dos eleitores foi espontânea, que não houve cadastramento ou controle prévio, razão pela qual não há como fazer registro no balanço contábil.
Também alegou que não houve qualquer contraprestação aos apoiadores, isto é, não custeou combustível para que os eleitores aderissem às suas carreatas (ID 124713542).
No entanto, um detalhe que chama muita atenção é o uso de roupas padronizadas pelos supostos eleitores que estariam participando espontaneamente dos eventos de campanha. De fato, é muito estranho que pessoas que participem de uma passeata/carreata de forma espontânea e não organizada previamente estejam com a vestimenta padronizada.
Diante desse fato, as conclusões do Ministério Público se mostram mais verossímeis que as da prestadora de contas.
ii.2) indícios de omissão ou subdeclaração de despesas
Consignou o Parquet Eleitoral(ID 124686287), verbis:
“Além disso, nota-se a ausência de documentos que comprovem as despesas com serviços advocatícios e contábeis, alegadamente custeados por um terceiro, no caso, um eleitor, sem, contudo, a apresentação de notas fiscais que atestem a regularidade dessa transação.
Ressalta-se que o devido detalhamento das despesas com serviços advocatícios e contábeis são fundamentais para o correto desenvolvimento da campanha. Embora tenha afirmado que esses custos seriam arcados por terceiros, não apresentou as notas fiscais e documentos comprobatórios necessários para respaldar essa afirmação, o que prejudica a transparência e a veracidade das informações prestadas.” (Grifei)
Sobre o tema, a prestadora alega que os valores foram pactuados entre contratante e contratado, não tendo ingerência sobre o assunto (ID 124713542).
Nota-se que deixou de apresentar nota fiscal ou qualquer outro documento capaz de comprovar a realização da despesa, perdendo uma excelente oportunidade para afastar a suspeita ministerial.
Nesse contexto, a ausência de informações e documentos comprobatórios da realização de despesas compromete a confiabilidade das contas apresentadas pelo prestador.
Na linha do entendimento amplamente pacificado pelo E. Tribunal Superior Eleitoral, são inaplicáveis, in casu, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas quando os vícios impedem a fiscalização pela Justiça Eleitoral, “comprometendo a confiabilidade e a regularidade da prestação de contas” (TSE - PC: 00005165520166000000 BRASÍLIA - DF 51655, Relator: Min. Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 26/05/2020, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico).
Diante do exposto, considerando que a(s) falha(s) remanescente(s) compromete(m) a regularidade, a transparência e a confiabilidade do balanço contábil em análise, JULGO DESAPROVADAS as contas apresentadas pelo candidato Francisca Patrícia Pereira Teles, nos termos do art. 74, III, da Resolução TSE n.º 23.607/2019.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Ciência ao Ministério Público Eleitoral pelo sistema PJe.
Serve a presente sentença como mandado/ofício e demais expedientes necessários.
Todos os atos processuais serão cumpridos de ordem.
Após o trânsito em julgado, façam-se as devidas anotações nos sistemas SICO e ELO.
Ao final, arquivem-se.
Bacabal-MA, datado e assinado eletronicamente.
Juiz Eleitoral
Trata-se de prestação de contas final apresentada por JOAO GARCEZ FILHO, candidato nas Eleições 2024 ao cargo de vereador do município de Bacabal - MA.
Emitido relatório preliminar opinando pela realização de diligências (Id 124533212).
O requerente apresentou contas retificadoras (Id´s 124629879 e s.s.), bem como petição de defesa com juntada de documentos (Id 124635314).
Parecer técnico conclusivo opinando pela desaprovação das contas (Id 124653158).
Manifestação do Ministério Público Eleitoral pela “DESAPROVAÇÃO das contas de campanha sob exame, nos termos do artigo 74, inciso III, da Resolução nº 23.607/2019 do Tribunal Superior Eleitoral, com a consequente aplicação da multa no valor de 100% (cem por cento) da quantia excedida, conforme estabelece o artigo 27, § 4º, da Resolução TSE nº 23.607/2019” (Id 124706719).
É o relatório. Decido.
O parecer técnico conclusivo aponta as seguintes irregularidades na prestação de contas em análise:
Não há informação de despesa com serviços prestados pelo profissional de contabilidade e pelo advogado, necessário que o prestador de contas apresente esclarecimento e comprovação em relação à origem dos recursos financeiros pagos a esses profissionais;
Foram identificadas as seguintes divergências entre as informações relativas às despesas, constantes da prestação de contas, e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, obtidas mediante circularização e/ou informações voluntárias de campanha e/ou confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais, revelando indícios de omissão de gastos eleitorais, infringindo o que dispõe o art. 53, I, g, da Resolução TSE n. 23.607/2019;
O valor dos recursos próprios supera em R$ 3.503,94 [soma RP menos 10% do limite de gastos fixado para a candidatura] o limite previsto no art. 27, §1º, da Resolução TSE nº 23.607/2019.
Em relação às despesas com serviços de contabilidade e de advogado, o requerente apresentou os respectivos contratos de prestação de serviços (Id´s 124635316 e 124635317), comprovando que os gastos foram custeados pela eleitora DANIELLE MATOS DE MELO SOUSA.
Nesse caso, a legislação eleitoral prevê que os gastos não estão sujeitos à contabilização e não configuram doação eleitoral (Resolução TSE n. 23.607/2019, Art. 43). Portanto, afastada a irregularidade.
Também não subsiste vício quanto às divergências entre as informações relativas às despesas, constantes da prestação de contas, e aquelas constantes da base de dados da Justiça Eleitoral, uma vez que o requerente comprovou que a dívida referente ao valor divergente (R$ 96,00) foi assumida pelo seu partido, em consonância com o que dispõe o § 3° do Art. 33 da Resolução TSE n. 23.607/2019.
Por outro lado, verifica-se que o candidato fez uso de recursos próprios na sua campanha, extrapolando o limite previsto na Resolução TSE n. 23.607/2019:
Art. 27. As doações realizadas por pessoas físicas são limitadas a 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos auferidos pela doadora ou pelo doador no ano-calendário anterior à eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 1º) .
§ 1º A candidata ou o candidato poderá usar recursos próprios em sua campanha até o total de 10% (dez por cento) dos limites previstos para gastos de campanha no cargo em que concorrer (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 2º-A) .
[...]
§ 4º A doação acima dos limites fixados neste artigo sujeita a infratora ou o infrator ao pagamento de multa no valor de até 100% (cem por cento) da quantia em excesso, sem prejuízo de a candidata ou o candidato responder por abuso do poder econômico, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 (Lei nº 9.504/1997, art. 23, § 3º) [...]
Cuida-se de irregularidade grave, considerando que a conduta afeta a igualdade de oportunidades entre os concorrentes, ao passo que compromete a lisura das contas de campanha, ensejando o pagamento de multa no valor correspondente à quantia em excesso. No caso dos autos, o valor excedente é de R$ 3.503,94 (três mil quinhentos e três reais e noventa e quatro centavos).
Cabe destacar que a mera alegação do requerente no sentido de que se trata de “apenas de falha formal” não tem o condão de afastar a irregularidade, considerando a natureza objetiva da norma. Nesse sentido:
ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. DOAÇÃO ACIMA DO LIMITE LEGAL. IMPOSIÇÃO DE MULTA. PRESCINDIBILIDADE DE ANÁLISE DE ELEMENTO SUBJETIVO NA CONDUTA DO DOADOR. CONFORMIDADE DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. SÚMULA N. 30 DESTE TRIBUNAL SUPERIOR. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. Nos termos da jurisprudência deste Tribunal Superior para fins de comprovação da capacidade financeira do doador, admitem-se apenas as declarações de imposto de renda apresentadas à Receita Federal do Brasil até a data do ajuizamento da representação.
2. Pela jurisprudência deste Tribunal Superior, a imposição de sanção por doação acima do limite legal decorre da simples inobservância da lei, de forma objetiva, independente de consideração sobre o elemento subjetivo na conduta do doador.
3. A negativa de seguimento a recurso especial eleitoral interposto contra decisão proferida em conformidade com a jurisprudência consolidada tem amparo na Súmula n. 30 deste Tribunal Superior.
4. Agravo regimental desprovido.
(AgR-AREspE n. 060009231, Acórdão, Min. Cármen Lúcia, DJE, 07.08.2023)
DISPOSITIVO:
Ante o exposto, julgo DESAPROVADAS as contas de campanha de JOAO GARCEZ FILHO relativas às Eleições 2024, aplicando-lhe multa no valor de R$ 3.503,94 (três mil quinhentos e três reais e noventa e quatro centavos).
Publique-se. Intimem-se.
Registre-se nos sistemas SICO e ELO.
Cientifique o Ministério Público Eleitoral.
Transitada em julgada a sentença, registre-se a multa aplicada em sistema informatizado, se disponível, ou em livro próprio para controle pela Justiça Eleitoral (Resolução TSE n. 23.709/2022, Art. 32, caput).
Após, intime-se imediatamente o Ministério Público Eleitoral para ingressar com o respectivo cumprimento de sentença, no prazo de 30 (trinta) dias (Resolução TSE n. 23.709/2022, Art. 33).
Cópia desta sentença poderá servir como mandado/ofício para todos os fins.
Bacabal - MA, datado e assinado eletronicamente.
THADEU DE MELO ALVES
Juiz Eleitoral
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